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Pedro Cardoso ao vivo e sem meias palavras chama a sociedade pra discutir comunicação pública. E voc


Você quer liberdade de expressão, quer se sentir representado na mídia e busca a cidadania de todos? Então precisamos conversar sobre Comunicação pública.


Uma TV em greve, um ator que protagoniza, fora de sua cena habitual, uma das situações mais comentadas da semana, uma apresentadora desconcertada e entrevistados atônitos. Muitos podem ter achado graça daquilo que fez Pedro Cardoso no último dia 23. Outros tantos certamente se sensibilizaram e até mesmo se preocuparam com a situação ocorrida durante o programa “Sem Censura”. Diante da recusa do ator em continuar no estúdio ao saber da situação vivida por funcionários, as opiniões do público podem ter pendido para um lado para ou para o outro. Fato é que a manifestação, a saia justa, a gafe, ou seja lá qual for o nome que você queira dar, serviu para que as pessoas procurassem entender a razão de toda a polêmica. E você, caro cidadão, o que tem com isso? Eu respondo: TUDO!

Parte significativa dos funcionários da Empresa Brasil de Comunicação está em greve (nesse momento a greve foi suspensa como parte da negociação). A luta é por uma série de melhorias nas condições de trabalho. No meio da pauta de reivindicações está um ponto central na defesa dos seus interesses. Você não leu errado, os funcionários da EBC e da TV Brasil, que faz parte da Empresa Brasil de Comunicação, entraram em greve para que todo brasileiro possa assistir a programas de uma emissora, de fato, pública. O que não acontece nos dias de hoje.

Parcela significativa dos brasileiros pode não saber, mas o direito à comunicação é constitucional. Está no documento de 1988. O acesso à informação é direito do cidadão. As emissoras públicas existem para dar vez e espaço a vozes negligenciadas e silenciadas, na maior parte das vezes, pelas emissoras comerciais ou mesmo pelas emissoras governamentais e legislativas. A TV Pública é o espaço para a diversidade, para discutir política, economia, educação, saúde... É ambiente criado para ser independente de qualquer interesse, da disputa de poderes ou de questões econômicas. Ela foi criada para que todos os brasileiros pudessem se reconhecer e também se sentirem representados pela emissora. Numa TV Pública não pode faltar verdade, não pode faltar o outro lado da narrativa, ou melhor, os outros lados da notícia sejam eles quantos forem.

O problema é que desde que a presidente Dilma Rousseff foi afastada do cargo, no dia 12 de maio de 2016, a Empresa Brasil de Comunicação sofre com mudanças na sua estrutura e funcionamento. Menos de uma semana depois de Michel Temer assumir, na época temporariamente, o governo do país, o jornalista Ricardo Melo foi retirado do comando da EBC numa medida arbitrária e ilegal. Na legislação que criou a empresa estava previsto que o cargo de presidente seria de quatro anos sem que o executivo pudesse alterá-lo. Tanto que Laerte Rimoli, nomeado por Temer para a função só esteve na cadeira da presidência da EBC por duas semanas. O Ministro Dias Toffoli decidiu pelo retorno de Melo, por meio de uma liminar.

Quando o afastamento da presidente eleita Dilma Rousseff tornou-se definitivo, o governo Temer publicou, em dois de setembro, a MP 744. A medida provisória extinguiu o conselho curador da EBC. Era esse conselho, formado principalmente por representantes da sociedade civil organizada, que garantia a autonomia e a participação de toda a sociedade na programação audiovisual da EBC. E não parou por ai. A MP alterou também o Conselho de Administração incluindo representantes do executivo, e excluindo o artigo que garantia a autonomia da EBC em relação ao Governo Federal. Acabou ainda com o mandato fixo do presidente da empresa, que pode ser substituído sempre que o governo desejar; encerrou-se assim o caráter público inscrito na lei de criação da empresa. A situação explicita ainda a tentativa de impor uma comunicação institucional e partidária neste veículo. Não que isso já não tivesse sido experimentado outrora, mas nunca essa tentativa de cercear a imprensa foi tão intensa quanto no início de 2017. As mudanças seguem no sentido oposto ao direito irrestrito à comunicação.

É por isso, que uma situação como a manifestação do ator Pedro Cardoso foi tão representativa. Estivesse ele certo ou errado, a atitude e a polêmica serviram para alertar esta parcela da população alheia quanto ao período nebuloso por que passa a comunicação pública no Brasil. O episódio deu visibilidade à greve dos servidores que lutam pela preservação dos próprios direitos e do seu direito, leitor, enquanto cidadão. O engajamento nesse tipo de movimento de mobilização depende de situações que promovam a identificação com a causa.

A hora é oportuna principalmente pra todos aqueles que reclamam do “poder nocivo” das emissoras e do potencial “manipulador da mídia” entenderem a razão de ser das emissoras públicas. O momento é propício pra que essas pessoas ampliem a discussão sobre a comunicação pública, sobre o direito constitucional à comunicação, sobre a liberdade de imprensa, sobre a defesa da diversidade de assuntos e ainda sobre a pluralidade na representatividade política.

A recusa em permanecer no estúdio e a greve dos servidores da EBC apontam pra necessidade de que os cidadãos se informem e se posicionem (ou contra ou a favor, mas que se posicionem). A liberdade de expressão é fundamental e merece respeito. Imprescindível é que cidadãos conscientes tenham opinião embasada, coerente com as suas visões de mundo e que essa opinião possa garantir seu engajamento na defesa dos seus direitos e também do interesse público.

Reproduzir discursos sem informação e sem reflexão é seguir na contramão da cidadania. Permitir que o cerceamento da mídia pública aconteça, permanecer inerte aos movimentos de mobilização, não fomentar a discussão séria sobre o momento vivido pela comunicação pública brasileira significa dar carta branca aos desmandos e descaminhos da comunicação.

E não pense você, caro leitor, que este capítulo na história da EBC foi um fato corriqueiro e sem relevância. Diante da “deixa” para a ampliação do debate na sociedade, a atual direção da EBC, teria cogitado a possibilidade de o programa “Sem Censura” deixar de ser ao vivo. Ora, se a partir de agora o programa passasse a ser gravado, possivelmente editado, e, caso a livre comunicação fosse deixando de existir e não acontecesse a participação ativa do cidadão, daqui por diante, seria pertinente começar a pensarmos um outro nome ao programa. Tomara que não!

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