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O decreto que facilita o porte de armas e a cobertura pela mídia

Atualizado: 9 de jun. de 2019

Por Ana Schuchter


Em meio às discussões e manifestações sobre o recente corte de verbas nas Universidades Públicas, outra questão ganhou repercussão no governo de Jair Bolsonaro e teve uma cobertura falha pelo Jornalismo e pelas redes sociais: o decreto Nº 9.785 que facilita o registro, a venda, a importação e o acesso ao porte de armas de fogo no Brasil.


Publicado na última quarta feira, dia 8, no Diário Oficial da União, o decreto está sendo questionado no Supremo Tribunal Federal e no Congresso somente quanto à legalidade e constitucionalidade. Enquanto isso, o cenário de segurança pública e de violência que envolvem a medida não tem sido debatido. Da mesma forma, alguns veículos de comunicação seguem esta tendência e pouco informam sobre as consequências para a população urbana, sobre a perseguição e altos índices de violência contra as pessoas negras ou sobre os ataques no campo e nas áreas rurais que se ligam diretamente ao’’ porte de armas’’, ou seja, carregar consigo arma e munição legalmente.


No quesito informação, cumprindo uma das bases e funções do jornalismo, a de informar , os portais online Istoé, G1, Nexo Jornal, Uol e BBC News Brasil por exemplo, cumprem seu papel: apresentam reportagens e pequenos vídeos sobre as alterações que o decreto trouxe. Modificando o Estatuto do Desarmamento, lei federal de 2003, dentre as mudanças, a partir de agora armas que antes eram de uso exclusivo de de policiais e do Exército podem ser usadas por cidadãos comuns que se encaixarem nos critérios. Somado a isso, 20 categorias, como jornalistas das área policial, residentes de área rural, políticos com mandato e caminhoneiros não precisam mais comprovar “efetiva necessidade” para portar uma arma e pessoas com menos de 18 anos podem praticar tiro esportivo sem aval da Justiça, apenas dos pais.



mulher segurando arma de fogo
Porte de arma de fogo é tema em discussão na política e na mídia

Ainda buscando situar os leitores e o público, os mesmos veículos de comunicação também abordaram sobre a possibilidade do projeto não seguir à risca as leis da Constituição. Tanto no Supremo, através da ação do partido Rede de Sustentabilidade, quanto no Congresso, por representantes de diferentes partidos, a medida está sendo questionada por extrapolar os poderes de um decreto de um presidente , assim como não revela evidências científicas que a medida beneficie a segurança pública no país. Portanto, o decreto ainda apresenta chances de ser suspenso.


Entretanto, é justamente na ocupação e posição de ampliar o debate para os cidadãos e apresentar visões críticas para que se possa ter riqueza de informações e consequentemente autonomia e independência de pensamento e de olhar social e político, que o Jornalismo, como instituição, falha. No livro “Os Elementos do Jornalismo: o que os jornalistas devem saber e o público deve exigir’’ , os autores colocam que o jornalismo serve para construir a democracia fornecendo informações às pessoas para que sejam livres e capazes de se autogovernar. Contrariando isso, os veículos de comunicação citados restringiram a questão às mudanças que o decreto implementou e pouco falaram sobre as políticas de enfrentamento ao crime e à violência que desconsideram as desigualdades econômicas e sociais do Brasil e sobre como essa medida pode ser ainda mais negativa a determinados grupos.


De forma semelhante a de Bolsonaro que parece não dominar e compreender a complexidade do debate do decreto, falando que medida é ‘’mais importante que um projeto de segurança pública’’ sendo um ‘’ direito individual’’ , vistos na cerimônia de assinatura e na transmissão ao vivo no seu perfil no facebook, estes veículos de comunicação não se preocuparam em aprofundar o debate sobre os significado e desdobramentos de um acesso mais fácil às armas de fogo no Brasil e como isso representa um ataque aos direitos humanos.


Exemplo desse desserviço ganha contornos reais com o editorial do Grupo Bandeirantes a favor do decreto que seria fruto de ‘’vontade popular’’ segundo posicionamento divulgado na sexta, dia 10, no Jornal da Band, pelo âncora Rafael Colombo. O grupo acaba por limitar reflexões e negar outros e mais aprofundados debates sobre o tema ao apresentar a ‘’opinião’’ da empresa, nas próprias palavras do jornalista, aos consumidores do telejornal.


A questão segue em discussão no Governo e seguiremos acompanhando buscando traçar caminhos para um jornalismo cada vez mais crítico e plural que tenha como raízes os direitos humanos.

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