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Vitória da seleção brasileira de futebol feminino e transmissão com placar negativo para as mulheres

Iluska Coutinho


O domingo, 09 de junho, começou com três gols da jogadora Cristiane que garantiram a vitória do Brasil sobre a Jamaica na estréia da Copa do Mundo de Futebol Feminino, disputada na França. Na transmissão da primeira partida pela Rede Globo porém as mulheres não tem o que comemorar.


Jogadora Cristiane responsável pelos 3 gols da Seleção. Fonte: El País

O comando coube a Galvão Bueno, narrador oficial da seleção brasileira de futebol, a masculina, embora a cobertura esportiva em geral silencie o gênero, o que só contribui para a invisibilidade das jogadoras. Caio Ribeiro e Ana Thais Matos, seriam os comentaristas enquanto Carol Barcellos fazia a reportagem de campo.


Há algum tempo as jornalistas esportivas parecem estar se tornando visíveis na cobertura de futebol, à despeito dos recorrentes casos de assédio. Eles motivaram no último ano inclusive a campanha #DeixaElaTrabalhar, que ganhou cobertura da mídia, e espaço nos noticiários da própria Rede Globo.


Com quase dez anos de carreira a jornalista Ana Thais Matos se tornou a primeira mulher a comentar partidas de futebol na televisão aberta brasileira. Em matéria publicada na revista Glamour, ela defende que o esporte é um espaço de pluralismo e diversidade, embora ressalte que “a mulher que opina é um incômodo”. Na matéria da publicação, voltada ao público feminino, Ana Thais ainda revelou ser mais respeitada por técnicos e jogadores que por torcedores e colegas de profissão.


A transmissão desse domingo infelizmente confirma a avaliação. Como narrador da partida Galvão Bueno demonstrou ao longo de quase duas horas que o placar ainda é negativo para as mulheres no futebol, e em sua cobertura. Preparadas, Ana Thais e Carol tiveram uma participação apenas subalterna; na TV a estréia da seleção brasileira de futebol feminino nos lembra que vivemos em uma sociedade machista e patriarcal.


Pouco acionada pelo narrador da partida, Ana Thaís Matos demonstrou em suas participações que tinha conhecimento e informação, capacidade de avaliar com competência e precisão. Ainda assim, era Caio Ribeiro o interlocutor preferencial de Galvão Bueno, que acionava o ex-jogador mesmo após participações da comentarista, que ficavam sem resposta (ou no vácuo, como preferem alguns). O locutor esportivo acionava a comentarista apenas para pedir informações, como em uma consulta a um banco de dados.


Já a repórter Carol Barcellos tentou em diversos momentos chamar a atenção do narrador, para contribuir com informações e comentários....sem sucesso. A dificuldade de participar da transmissão ficou ainda maior após corrigir um erro de Galvão, quanto à família de uma jogadora. Incomodado, ele narrou a correção como uma rasteira; mais tarde ao associar a informação correta à jogadora Daiane, ainda tentou constranger a repórter.


Se o tratamento dispensado às jornalistas reforça a necessidade da campanha #DeixaElaTrabalhar, a forma de narração da partida ainda é marcada pelos estereótipos que segundo o coletivo Think Olga caracterizam a cobertura esportiva. Ao contrário das boas práticas sugeridas no Manual de Jornalismo Humanizado (Think Olga, 2017), as jogadoras de futebol são apresentadas como meninas. Repetida, a referência infantiliza a cobertura, reduzindo a importância profissional do trabalho das jogadoras de futebol feminino.


Ao longo da transmissão Galvão Bueno ainda repete várias vezes que a torcida gosta muito das meninas, que abraçou a seleção, como a indicar uma espécie de concessão, em lugar de reconhecimento. O próximo jogo do Brasil na Copa do Mundo de futebol feminino está marcado para a próxima quinta-feira, dia 13 às 13 horas; a convocação feita pelo narrador da Globo é para um personagem famoso na história do futebol brasileiro, só que masculino: Zagallo.

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